quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Como a Torre de Vigia Toma as Suas Decisões

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“A Bíblia descreve também a parte visível da organização de Jeová e ajuda-nos a entender como Ele a dirige. Se tivermos realmente compreensão espiritual dessas coisas, isso nos ajudará a ‘andarmos dignamente de Jeová, com o fim de lhe agradarmos plenamente’.”
Livro "Unidos na Adoração do Único Deus Verdadeiro", p. 117 (publicado pela Watchtower)

Quando um grupo de Testemunha de Jeová está prestes a se batizar em um congresso ou assembléia, escuta do orador que faz o discurso de batismo duas perguntas, e em uníssono todos no grupo respondem: “Sim!” Uma das perguntas é se os batizandos estão conscientes que fazem parte da “organização de Deus que é dirigida pelo seu espírito”. Quando uma Testemunha escuta essa palavra “organização” ela tem em mente toda a estrutura hierárquica que se ramifica desde Brooklin, Nova Iorque, encabeçada pelo chamado Corpo Governante, o qual, segundo crêem, é dirigido pelo espírito santo. Esse é o conceito prevalecente entre as Testemunhas de Jeová, de que a sua religião não é dirigida por homens, mas pelo espírito de Deus. Mas raramente elas param para pensar como se dá essa “direção teocrática” e quão factual ela é.
Se Deus é quem comanda as decisões de quem está na dianteira mundial das Testemunhas de Jeová, seria de se esperar que essas decisões fossem acertadas e sempre benéficas para toda a irmandade. Mas o que o tempo tem revelado? Veja um exemplo simples, desprovido de grandes polêmicas, mas que serve muito bem para ilustrar essa situação:
“Representantes da filial [da Torre de Vigia] compareceram perante a comissão [do Governo], explicando que as Testemunhas não podem aceitar nenhum substituto, qualquer que seja, do serviço militar, por mais digna que seja a tarefa. Mostraram que as Testemunhas de Jeová já realizam uma forma de serviço social no seu ministério de casa em casa, ajudando as pessoas a limpar sua vida e a se tornar cidadãos respeitáveis e acatadores das leis.”
Anuário das Testemunhas de Jeová de 1991, p. 166, § 3.

A citação acima é o conceito que foi defendido durante muitos anos pelo Corpo Governante: dizer que é errado os jovens Testemunhas aceitarem um serviço civil, no lugar de um serviço militar, mesmo que suas consciências permitam isso. Embora, perante o público de fora, sempre se passasse uma imagem de que o jovem poderia decidir isso sem nenhum tipo de coerção, na verdade, o jovem que assim o fizesse seria desassociado (excomungado), como sendo uma pessoa desleal a Deus, e todos os seus irmãos a partir daí estariam proibidos de falar com ele, e de cumprimentá-lo. É assim que funciona a excomunhão entres as Testemunhas de Jeová. Qual foi o resultado desse conceito? Muitos jovens ao redor do mundo foram presos, separados de suas famílias, sofreram maus tratos ou pressões psicológicas, porque não aceitavam trabalhar em locais tais como creches, hospitais e orfanatos – alternativas oferecidas por vários governos do mundo. Na mente daqueles jovens sofredores estava aquela convicção de que faziam isso por obediência à “orientação de Deus”, mesmo que em suas consciências pairasse aquela dúvida de qual problema haveria se eles trabalhassem em algum serviço comunitário sob supervisão do governo secular.
No entanto, a revista A Sentinela de 1º de maio de 1996 mudou abruptamente essa norma e permitiu que os jovens Testemunhas tomassem essa decisão com base em suas consciências:
“Pode o cristão dedicado prestar tal serviço? Novamente, o cristão dedicado e batizado terá de fazer a sua própria decisão à base da sua consciência treinada pela Bíblia.” – p. 19, § 16*.
O artigo chegou a dizer que os jovens que optassem por essas alternativas não deveriam ser recriminados por outras Testemunhas, nem considerados infiéis, contradizendo assim a anterior posição. Em momento algum o artigo lamentou o antigo conceito, e disse que ele era uma mera opinião de quem estava na liderança da organização.
Certamente nenhuma Testemunha de Jeová dirá que o espírito santo de Deus induz ao erro ou a opiniões equivocadas. Então, como se explica esse lamentável caso do serviço civil alternativo? Seria Deus responsável por esse erro? A única maneira de se entender esse caso é perguntar para alguém que esteve entre os que tomam decisões no Corpo Governante, e como se dá essa alegada “orientação de Deus”.
Um bem conhecido membro das Testemunhas de Jeová, Raymond Franz, que fazia parte do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, em Nova Iorque, relata em sua autobiografia que as decisões do Corpo Governante são tomadas através de votação, e que um assunto só é aprovado se dois terços dos membros do Corpo aprovarem essa mudança, e que em assuntos polêmicos raramente há unanimidade nas votações.
Franz conta que por diversas vezes o assunto do serviço civil alternativo veio à tona nas reuniões secretas do Corpo Governante, e sempre que esse assunto voltava à pauta, havia em seguida uma votação para determinar se a norma seria modificada ou não. Em todos os casos, a maioria dos presentes era favorável à mudança, mas isso nunca acontecia porque não se atingia a maioria de dois terços, necessária para mudança de doutrinas. (Essa regra é semelhante ao que é praticado no Colégio de Cardeais da Igreja Católica, que também segue a maioria de dois terços nas suas decisões). O próprio Franz diz que ele apresentou “cerca de quatorze páginas de evidências históricas, bíblicas e lexicais” que davam suporte a uma mudança dessa posição. Além disso, vários membros do Corpo alegavam não terem tempo de ler as evidências escritas que eram apresentadas. Eles não demonstravam que consideraram o assunto com profunda meditação e oração, e raramente manuseavam a Bíblia durante as discussões.
Por não concordar com essas atitudes desleixadas por parte dos outros membros do Corpo Governante, Franz decidiu não fazer mais parte daquele grupo e foi servir em uma congregação local das Testemunhas de Jeová dos Estados Unidos. Posteriormente, porém, ele foi excomungado (muitos acreditam que essa foi a maneira encontrada pelo Corpo Governante para impedir que as Testemunhas de Jeová comuns soubessem como funcionam aquelas reuniões secretas do Corpo Governante, e de como os seus membros realmente tomam as decisões).
Raymond Franz também comenta a postura que os dirigentes das Testemunhas de Jeová demonstraram no desenrolar desse assunto, do serviço civil alternativo. Diz ele:
“Ao passo que a mudança é inquestionavelmente bem-vinda, não se pode deixar de pensar em todos os milhares de anos que, de modo coletivo, foram perdidos durante meio século por varões Testemunhas, no que diz respeito à liberdade de se associarem com suas famílias e amigos.... Isso representa um incrível desperdício de anos valiosos pela simples razão de que aquilo não era necessário, sendo resultado de uma posição não-bíblica, imposta pela autoridade organizacional.
“Caso tivesse havido um franco reconhecimento do erro, e não de um erro doutrinal, mas do erro de incorretamente invadir-se o direito de consciência dos outros, e uma demonstração de pesar pelas conseqüências danosas de tê-lo feito, poder-se-ia achar esperança de uma certa medida de reformas fundamentais [na religião das Testemunhas de Jeová.]. A Sentinela de 1º de maio de 1996, porém, em parte alguma trata destes aspectos, e não traz sequer alguma indicação de lamento pelos efeitos da posição errada que foi imposta por mais de meio século. Não oferece nem mesmo uma explicação do motivo pelo qual se insistiu tão rigidamente nesta diretriz equivocada por mais de 50 anos. Num par de sentenças ela faz a mudança, como que por um decreto, decreto que para todos os efeitos diz ‘sua consciência pode agora atuar nesta área’. Em lugar de um pedido de desculpas, a organização parece preferir sentir que merece aplausos por ter feito as mudanças que ela deveria ter tido o bom senso (e a humildade) de ter feito décadas antes, mudanças a que ela resistiu mesmo diante de amplas evidências apresentadas nas Escrituras, provindas tanto do Corpo [Governante] como das comissões dos escritórios de filial. Algumas dessas comissões apresentaram não somente toda a evidência bíblica que se encontra em A Sentinela de 1º de maio, mas também evidências bíblicas ainda mais extensas e mais cuidadosamente arrazoadas. Elas fizeram isso lá em 1978, mas tudo que elas escreveram foi, na verdade, posto de lado ou descartado por aqueles do Corpo Governante que se empenharam em manter intocada a diretriz tradicional.” – Livro “Crise de Consciência”, de Raymond Franz, pp. 495-497, primeira impressão da primeira edição, G. M. Multimídia Editora Ltda, Fortaleza, Ceará; colchetes acrescentados.
Portanto, é assim a suposta orientação divina que os líderes das Testemunhas de Jeová recebem. Não passa de opiniões de homens que são discutidas secretamente e votadas, sem nenhum encargo para suas consciências, não importando se essa ou aquela decisão afetará negativamente a vida das Testemunhas de Jeová através do mundo. Infelizmente esse lado da “organização de Jeová” as Testemunhas de Jeová ao redor do Globo desconhecem. Tudo porque os líderes dessa religião não querem que seus seguidores descubram que Jeová não tem nada haver com seus pensamentos e decisões erradas. Chegam ao ponto de tecerem palavras de intimidação e de julgamento para aqueles que se recusam a aceitar essa suposta orientação divina. Isso é visto em palavras tais com as palavras citadas no início, do livro Unidos, que afirmaram indiretamente que quem não aceita que a religião das Testemunhas de Jeová é comandada diretamente por Deus é indigno Dele e sem visão espiritual.
Quanto aos que são taxados de iníquos e infiéis a Deus por não seguirem as regras de homens elaboradas em reuniões secretas, lembrem-se que repousam sobre as cabeças desses “juízes” da vida alheia as seguintes palavras: “Eu vos digo que de toda declaração sem proveito que os homens fizerem prestarão contas no Dia do Juízo; pois é pelas tuas palavras que serás declarado justo e é pelas tuas palavras que serás condenado.” E ainda: “Chamar o justo de iníquo e o iníquo de justo – ambas as situações são detestáveis para Deus.” – Mateus 12:36, 37; Provérbios 17:15.


* No Brasil, até 2003 não havia uma regulamentação do serviço civil alternativo. Mas em 2004 o governo publicou uma portaria do Diário Oficial da União, estabelecendo o serviço civil e prevendo a convocação de milhares de Testemunhas de Jeová que entraram com um processo de eximição do serviço militar. O governo cancelará todos esses processos. Daqui em diante, qualquer jovem das Testemunhas de Jeová poderá optar por um serviço civil, no lugar de um serviço militar. Isso possibilitará que o jovem não perca seus direitos políticos, e possa prestar concursos públicos, os quais não seriam possíveis com a eximição.
Obs.: Este artigo foi escrito por uma testemunha de Jeová que atua como Servo Ministerial.

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