quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Breve Estudo Sobre As Testemunhas de Jeová

As origens das Testemunhas de Jeová remontam ao movimento adventista do século 19 na América. Esse movimento começou com William Miller, um pregador baptista leigo que, no ano 1816, começou a proclamar que Cristo regressaria em 1843. As suas predições sobre a Segunda Vinda ou Segundo Advento prenderam a atenção de milhares de pessoas que pertenciam a igrejas baptistas ou a outras igrejas principais. Talvez cerca de 50.000 seguidores colocaram a sua confiança nos cálculos cronológicos de Miller e prepararam-se para dar as boas-vindas ao Senhor, enquanto que, à medida que o tempo designado se aproximava, outros observavam nervosamente à distância. Novos cálculos mudaram o prometido segundo advento de Março de 1843 para Março de 1844, e depois para Outubro desse ano. Mas eis que também essa data passou sem nada ocorrer.
Depois do "Desapontamento de 1844" o movimento de seguidores de Miller desintegrou-se, com a maioria daqueles que se tinham voltado para ele regressando às suas respectivas igrejas antes da morte dele em 1849. Mas outros seguidores desapontados mantiveram o movimento vivo, embora numa forma fragmentada. Com o passar do tempo as suas actividades levaram à formação de várias seitas sob o rótulo de "adventismo", incluindo a Igreja Cristã do Advento, a União da Vida e do Advento, os Adventistas do Sétimo Dia e vários grupos do Segundo Advento.
Um pormenor interessante: os Branch Davidians, que morreram em Waco, Texas, sob a liderança de David Koresh, também têm origens que remontam à mesma fonte Millerita através de uma linha de descendência diferente. Em 1935 a Igreja Adventista do Sétimo Dia expulsou um imigrante búlgaro chamado Victor Houteff, que tinha começado a ensinar as suas próprias opiniões sobre certas passagens de Revelação ou Apocalipse, o último livro da Bíblia. Houteff estabeleceu o movimento na propriedade de Waco. Depois de se referir à sua minúscula nova seita como A Vara do Pastor, Houteff e os seus seguidores em 1942 incorporaram o movimento e mudaram o seu nome para Adventistas Davidianos do Sétimo Dia. Houteff morreu em 1955 e em 1961 a sua esposa Florence desmantelou oficialmente a seita, mas alguns seguidores sob a liderança de um homem de negócios do Texas chamado Benjamin Roden assumiram o controle da propriedade. Roden morreu em 1978, deixando a sua esposa Lois e o seu filho George na liderança do grupo. Então, em 1987, David Koresh assumiu a posição de líder e a tragédia que se seguiu é do conhecimento público.
As Testemunhas de Jeová, tal como os seguidores de David Koresh, têm raízes que remontam aos adventistas. Mas elas não costumam admitir isto às pessoas de fora; e muitas Testemunhas não conhecem os detalhes. As Testemunhas de Jeová estão habituadas a defenderem-se contra a acusação de que são uma nova seita religiosa. Frequentemente respondem que o seu grupo religioso é o mais antigo de todos, mais antigo que as igrejas católica e protestantes. De facto, o seu livro As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino afirma que "as testemunhas de Jeová têm uma história com quase 6.000 anos de duração, que começa quando o primeiro homem, Adão, ainda estava vivo", que Abel, filho de Adão, foi "a primeira de uma linha ininterrupta de Testemunhas", e que "os discípulos de Jesus também eram todos testemunhas [sic] de Jeová". (pp. 8-9)
Claro que uma pessoa de fora que ouve essas pretensões percebe rapidamente que a seita apropriou-se simplesmente de todas as personagens citadas na Bíblia como testemunhas fiéis de Deus. Através dessa extrapolação a denominação consegue esticar a sua história até aos começos da família humana -- pelo menos aos olhos dos aderentes que estão dispostos a aceitar esses argumentos. Mas observadores de fora geralmente rejeitam este tipo de retórica e em vez disso reconhecem que as Testemunhas só remontam a Charles Taze Russell, que nasceu em 16 de Fevereiro de 1852 em Pittsburgh, Pennsylvania.
Criado originalmente como presbiteriano, Russell tinha 16 anos e era membro da Igreja Congregacional no ano 1868, quando deu consigo a perder a fé. Ele tinha começado a duvidar não só dos credos e doutrinas da igreja, mas também de Deus e da própria Bíblia. Neste momento crítico um encontro acidental restaurou a sua fé e colocou-o sob a influência do pregador do Segundo Adventismo Jonas Wendell.
Durante alguns anos depois disso Russell continuou a estudar as Escrituras com e sob a influência de vários leigos e clérigos adventistas, especialmente o ministro da Igreja Cristã do Advento George Stetson e o editor do Bible Examiner, George Storrs. Ele reuniu-se localmente numa base regular com um pequeno círculo de amigos para discutir a Bíblia, e este grupo de estudo informal passou a encará-lo como o seu líder ou pastor.
Em Janeiro de 1876, quando tinha 23 anos, Russell recebeu uma cópia de The Herald of the Morning, uma revista adventista publicada por Nelson H. Barbour, de Rochester, Nova Iorque. Uma das características distintivas do grupo de Barbour naquele tempo era a crença de que Cristo tinha voltado invisivelmente em 1874, e este conceito que era apresentado no The Herald prendeu a atenção de Russell. Significava que este grupo dissidente não tinha ficado derrotado, ao contrário de outros, quando Cristo não apareceu em 1874 como os líderes adventistas tinham predito; de algum modo este pequeno grupo tinha conseguido agarrar-se àquela data afirmando que o Senhor tinha de facto voltado no tempo designado, mas de forma invisível.
Era este pensamento apenas um reflexo dos seus desejos, ligado à sua recusa obstinada em admitir o erro de cálculos cronológicos falhados? Talvez, mas Barbour tinha alguns argumentos a oferecer em apoio das suas afirmações. Em particular, ele arranjou uma base para reinterpretar a Segunda Vinda como um evento invisível. Na Emphatic Diaglott, tradução do Novo Testamento de Benjamin Wilson, a palavra traduzida "vinda" na King James Version em Mateus 24:27, 37, 39 é em vez disso traduzida como "presença". Isto serviu de base para o grupo de Barbour advogar, além dos seus cálculos envolvendo datas, uma presença invisível de Cristo.
Embora a ideia agradasse ao jovem Charles Taze Russell, o público leitor aparentemente recusou-se a acreditar na história de uma Segunda Vinda invisível, com o resultado de a publicação de N. H. Barbour The Herald of the Morning estar a falhar financeiramente. No verão de 1876 o endinheirado Russell pagou a viagem de Barbour a Filadélfia e encontrou-se com ele para discutir tanto crenças como finanças. O resultado foi que Russell tornou-se o apoiante financeiro da revista e o seu nome foi acrescentado ao cabeçalho como Editor Assistente. Ele contribuiu com artigos para publicação bem como dádivas em dinheiro, e o pequeno grupo de estudo de Russell também passou a estar afiliado com o grupo de Barbour.
Russell e Barbour acreditavam e ensinavam que a volta invisível de Cristo em 1874 seria seguida pouco tempo depois, mais especificamente na primavera de 1878, pelo Arrebatamento -- a transferência corporal dos crentes para o céu. Quando este aguardado arrebatamento não ocorreu no tempo previsto em 1878, o Sr. Barbour, editor do The Herald, apareceu com "nova luz" sobre esta e outras doutrinas. Russell, porém, rejeitou algumas das ideias novas e persuadiu outros membros a oporem-se-lhes. Por fim, Russell desistiu de pertencer à equipa da revista adventista e começou a sua própria revista. Chamou-lhe Zion's Watch Tower and Herald of Christ's Presence (Torre de Vigia de Sião e Arauto da Presença de Cristo) e publicou o primeiro número com a data de Julho de 1879. No princípio tinha a mesma lista de subscritores que o The Herald of the Morning e foi devotado espaço considerável a refutar esta publicação nos pontos em que havia desacordo, tendo Russell levado consigo uma cópia da lista dos assinantes quando renunciou ao cargo de editor assistente.
Nesta altura Charles Russell já não se queria considerar a si mesmo um adventista, nem um Millerita. Mas continuava a encarar Miller e Barbour como instrumentos escolhidos por Deus para conduzir o Seu povo no passado. A formação de uma denominação distinta à volta de Russell foi um desenvolvimento gradual. A sua ruptura imediata era, não com o adventismo, mas antes com a pessoa e as políticas de N. H. Barbour.
Também não foram erigidas imediatamente barreiras em relação ao protestantismo em geral. Os novos leitores que obtinham assinaturas da Zion's Watch Tower eram frequentemente membros das igrejas que viam a revista como um ministério para-igreja, não como uma alternativa anti-igreja. Russell viajava por vários sítios, falando dos púlpitos de igrejas protestantes bem como para ajuntamentos dos seus próprios seguidores. Em 1879, ano do seu casamento com Maria Frances Ackley e também ano em que começou a publicar a Zion's Watch Tower, Russell organizou cerca de trinta grupos de estudo ou congregações espalhados desde Ohio até à costa da Nova Inglaterra. Cada "classe" ou eclésia local passou a reconhecê-lo como "Pastor", embora a geografia e as actividades de escrita e editoriais de Russell impedissem mais que uma visita pastoral ocasional em pessoa.
Inevitavelmente, os ensinos cada vez mais divergentes de Russell obrigaram os seus seguidores a separarem-se de outros grupos das igrejas e a criar uma denominação própria. Tendo começado, como começou, num pequeno ramo do adventismo que foi ao extremo de estabelecer datas específicas para a volta de Cristo e o Arrebatamento, Russell foi ainda mais longe em 1882 ao rejeitar abertamente a doutrina da Trindade. O seu anterior mentor Nelson H. Barbour era um trinitarista, tal como também o outro editor assistente da The Herald of the Morning, John H. Paton, que se juntou a Russell quando este se afastou de Barbour para começar a Zion's Watch Tower. Os escritos de Barbour e Paton que Russell tinha ajudado a publicar ou a distribuir eram trinitaristas na sua teologia. E a própria Zion's Watch Tower a princípio era vaga e não se comprometia no assunto. Só foi depois de Paton cortar relações com ele em 1882, e deixar de ser mencionado no cabeçalho, que Russell começou a escrever contra a doutrina da Trindade.
Quando morreu, Charles Taze Russell tinha viajado mais de um milhão de milhas e tinha pregado mais de 30.000 sermões. Tinha escrito obras totalizando cerca de 50.000 páginas impressas, e cerca de 20.000.000 de cópias dos seus livros e folhetos tinham sido vendidas.
Tinha sido ensinado aos seguidores que o próprio Russell era o "servo fiel e sábio" de Mateus 24:45 e "o Mensageiro Laodicense", o sétimo e último porta-voz de Deus para a igreja cristã. Mas ele viveu o suficiente para ver o falhanço de várias datas que tinha predito para o Arrebatamento, e morreu finalmente em 31 de Outubro de 1916, mais de dois anos depois da data em que era suposto o mundo ter acabado, de acordo com os seus cálculos, no início de Outubro de 1914.
Os seus discípulos, no entanto, viram a Guerra Mundial que então decorria como uma razão para crer que "o fim" ainda era iminente. Enterraram Russell por baixo de uma pedra tumular que o identificava como "o Mensageiro Laodicense", e erigiram perto da sua campa uma pirâmide de pedra de várias toneladas brasonada com o símbolo da cruz e coroa de que ele tanto gostava, e o nome "Watch Tower Bible and Tract Society" (Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados). A pirâmide ainda existe no Cemitério Lane, em Ross, um subúrbio a norte de Pittsburgh, onde, segundo relatos, serve como o ponto focal de um espectáculo bizarro anualmente no Halloween [dia das bruxas, 31 de Outubro], quando os russellitas actuais fazem um círculo à volta da pirâmide, de mãos dadas, numa vigília comemorativa do dia da morte de Russell.
Segundo instruções que Russell deixou, o seu sucessor na presidência partilharia o poder com uma comissão editorial e com a directoria da empresa Torre de Vigia, que Russell tinha nomeado "vitaliciamente". Mas o vice-presidente Joseph Franklin ("Juiz") Rutherford depressa começou a concentrar toda a autoridade organizacional nas suas próprias mãos. Sendo um advogado habilidoso que tinha servido como principal conselheiro legal de Russell, ele combinava a capacidade legal com o que os oponentes indubitavelmente viam como uma abordagem maquiavélica à política interna da empresa. Assim, ele usou uma brecha na nomeação deles para desalojar a maioria dos directores da Torre de Vigia sem convocar uma votação dos membros. E até usou um subordinado para chamar a polícia aos escritórios da sede da Sociedade em Brooklyn para interromper a reunião da directoria e expulsá-los do local. (Faith on the March [A Fé em Marcha, 1957] de A. H. Macmillan, pp. 78-80)
Depois de se apoderar do complexo da sede e das entidades empresariais da seita, Rutherford voltou a sua atenção para o resto da organização. Substituindo gradualmente os anciãos eleitos localmente por homens nomeados por ele próprio, conseguiu transformar um grupo disperso de congregações semi-autónomas governadas democraticamente numa máquina organizacional coesa controlada a partir do seu escritório. Algumas congregações locais separaram-se, formando grupos russellitas dissidentes como os Chicago Bible Students (Estudantes da Bíblia de Chicago), os Dawn Bible Students (Estudantes da Bíblia da Aurora), e o Laymen's Home Missionary Movement (Movimento Missionário Lar do Leigo), todos eles continuando a existir ainda hoje. Mas a maioria dos Estudantes da Bíblia continuaram sob o controlo de Rutherford, e ele mudou-lhes o nome para "Testemunhas de Jeová" em 1931, para os distinguir de todos os outros grupos de Estudantes da Bíblia.
Entretanto, ele mudou a ênfase da seita do "desenvolvimento do carácter" individual para um vigoroso trabalho de testemunho público, distribuindo a literatura da Sociedade de casa em casa. Em 1927 esta distribuição de porta a porta tinha-se tornado uma actividade essencial requerida de todos os membros.
A literatura consistia primariamente das séries de ataques incessantes de Rutherford contra o governo, contra a proibição [de bebidas alcoólicas], contra o "alto comércio" e contra a Igreja Católica Romana. Ele também forjou uma enorme rede radiofónica e lançou-se nas ondas de rádio, explorando os sentimentos populistas e anti-católicos para atrair milhares de convertidos adicionais. Os seus ataques vitriólicos, que saíam de forma estridente de fonógrafos portáteis levados até às portas das pessoas e de altifalantes montados em carros de som estacionados em frente das igrejas, também trouxeram sobre as Testemunhas violência de multidões e perseguição dos governos em muitas partes do mundo.
Tal como Russell, Rutherford experimentou fazer profecias e predisse que os patriarcas bíblicos Abraão, Isaque e Jacó seriam ressuscitados em 1925 para governar como príncipes sobre a terra. (Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão, 1920, pp. 110-112) Eles não apareceram, claro, e Rutherford desistiu de predizer datas. De facto, referindo-se a esse falhanço profético ele mais tarde admitiu: "Eu me fiz de tolo". (Despertai!, 22 de Setembro de 1987, p. 19)
O Vice-Presidente Nathan Homer Knorr herdou a presidência quando Rutherford morreu em 1942 mas deixou os assuntos doutrinais principalmente nas mãos de Frederick W. Franz, que se juntara à seita nos tempos de Russell e tinha servido na sede de Brooklyn desde 1920. Não tendo o magnetismo pessoal e o carisma de Russell e de Rutherford, Knorr focou a devoção dos seguidores na organização "Mãe" em vez de nele próprio.
Depois de décadas a publicar livros e folhetos assinados pelos seus presidentes Russell e Rutherford, a Sociedade Torre de Vigia começou a produzir literatura que era escrita sob anonimato. Mas não era impessoal, visto que a própria organização era praticamente personificada, e os leitores eram orientados a "mostrar o nosso respeito pela organização de Jeová, pois ela é a nossa mãe e a amada esposa do nosso Pai celestial, Jeová Deus". (The Watchtower [A Sentinela], 1 de Maio de 1957, p. 285 [em inglês])
Administrador soberbo, Knorr mudou o foco da seita de liderança dinâmica para participação dinâmica dos membros. Ele iniciou programas de treinamento para transformar membros em recrutadores eficazes. Em vez de carregar um fonógrafo portátil de casa em casa, tocando discos dos discursos do "Juiz" Rutherford nos degraus das casas das pessoas, a Testemunha de Jeová típica começou a receber instrução sobre como falar de forma persuasiva. Homens, mulheres e crianças aprenderam a fazer sermões às portas sobre uma variedade de assuntos.
Entretanto Fred Franz trabalhava nos bastidores para restaurar a fé nos cálculos cronológicos da seita, um assunto largamente ignorado a seguir ao falhanço profético de Rutherford em 1925. A cronologia revista estabelecia a volta invisível de Cristo como tendo ocorrido em 1914 em vez de 1874 e, durante a década de 1960, as publicações da Sociedade começaram a apontar para o ano 1975 como o tempo provável do Armagedom e do fim do mundo.
A crença prevalecente entre as Testemunhas de Jeová hoje é que a Sociedade nunca predisse "o fim" para 1975, mas que alguns membros com excesso de zelo leram equivocadamente isso na mensagem. No entanto, a predição oficial está bem documentada. Veja por exemplo, o artigo intitulado "Por Que Está Aguardando 1975?" na Sentinela de 15 de Fevereiro de 1969, páginas 110-117. Admitindo uma pequena margem de erro, conclui uma longa discussão com este pensamento: "Devemos presumir, à base deste estudo, que a batalha do Armagedom já terá acabado até o outono de 1975 e que o reinado milenar de Cristo, há muito aguardado, começará então? Possivelmente, mas, nós esperamos para ver quão de perto o sétimo período de mil anos da existência do homem coincide com o reinado milenar de Cristo [...] A diferença talvez envolva apenas semanas, ou meses, não anos." (p. 115, § 30)
Os programas de Knorr para o proselitismo e as projecções apocalípticas de Franz para 1975 combinaram-se para produzir um crescimento rápido no número de membros, tendo a taxa de aumento anual alcançado um máximo de 13,5% em 1974. Tudo isto elevou a assistência às reuniões nos Salões do Reino das Testemunhas de Jeová de cerca de 100.000 pessoas em 1941 para cerca de 5 milhões em 1975. O crescimento desde então tem sido mais lento, mas razoavelmente constante na maioria dos anos, com o resultado de cerca de 11,5 milhões se terem reunido nos Salões do Reino na primavera de 1992 para a comunhão anual das Testemunhas ou serviço de Memorial comemorando a morte de Cristo com pão não fermentado e vinho tinto.
Durante a década de 1970 ocorreram mudanças na sede da Torre de Vigia no que diz respeito ao poder presidencial. Primeiro, aceitou-se em teoria que a Igreja Cristã (que as Testemunhas de Jeová acham ser a sua organização) não devia estar sob o controlo de um homem, devia em vez disso ser governada por um colectivo similar aos doze apóstolos. A directoria de 7 membros da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados de Pennsylvania tinha sido retratada anteriormente como cumprindo esse papel, mas em 1971 foi criado um Corpo Governante alargado com um total de 11 membros, incluindo os sete Directores. O objectivo era demonstrar que a liderança derivava a sua autoridade de uma fonte apostólica, e não da lei que regulava as empresas da Pennsylvania.
Este novo Corpo Governante foi exibido como mais uma evidência de que a seita era a verdadeira igreja, mas na realidade Nathan Knorr continuou a governar as Testemunhas de Jeová tanto como Russell e Rutherford tinham feito antes dele. Isto é, até 1975, quando membros do Corpo Governante começaram a insistir em exercer os poderes que lhes eram conferidos em teoria mas que na prática nunca lhes tinham sido dados. Passando por cima das objecções de Fred Franz, o Corpo que ele tinha sido instrumental em criar começou de facto a governar, de modo que quando Nathan Knorr morreu em 1977, Franz herdou uma presidência esvaziada de poderes.
Franz também herdou uma organização com problemas de descontentamento por causa do óbvio fracasso das suas profecias sobre o fim do mundo no outono de 1975. Mesmo na sede de Brooklyn pequenos grupos que se encontravam em privado para o estudo da Bíblia começaram a questionar não só a cronologia baseada em 1914 que tinha produzido a data limite de 1975, mas também o ensino relacionado de que a "chamada celestial" de crentes terminou em 1935, sendo os novos convertidos depois dessa data consignados a um paraíso terrestre como sua recompensa eterna.
A seita que até esta altura tinha crescido rapidamente começou a perder membros pela primeira vez em décadas, à media que as pessoas que tinham esperado o Armagedom em 1975 se foram desiludindo. Quando as perdas de membros ascenderam a centenas de milhares -- um facto ocultado pelas novas conversões nos números publicados pela Sociedade, mas relatado num artigo de investigação do Los Angeles Times de 30 de Janeiro de 1982 (pp. 4-5) -- o presidente Franz e a maioria conservadora do Corpo Governante tomaram acção. Na primavera de 1980 iniciaram acções disciplinares contra os dissidentes, desmantelando os grupos independentes de estudo da Bíblia na sede, e formando "comissões judicativas" para pôr aqueles que eram vistos como cabecilhas em julgamento sob acusações de "deslealdade" e "apostasia".
Quando esta purga culminou na renúncia forçada e subsequente desassociação de Raymond V. Franz, sobrinho do presidente e, tal como ele, membro do Corpo Governante (um desenvolvimento que a revista Time achou merecer um artigo de página inteira na edição de 22 de Fevereiro de 1982, p. 66), uma mentalidade de estado de sítio apoderou-se da organização em todo o mundo. Mesmo Testemunhas que saíram discreta e voluntariamente por razões pessoais foram denunciadas como desleais e ordenou-se que fossem evitadas, sendo os seus anteriores amigos proibidos de lhes dizer nem que fosse "um simples olá".
Assim, embora Frederick W. Franz tenha servido como o principal teólogo da seita durante cerca de cinquenta anos -- desde o princípio da presidência de Knorr em 1942 até à sua própria morte em 22 de Dezembro de 1992 -- o facto de ele ter sobrevivido às suas falsas profecias durante mais de quinze anos exigiu que impusesse uma mini-inquisição sobre os membros para poder manter em vigor o seu quadro doutrinal e cronológico durante o resto da sua vida.
A selecção de Milton G. Henschel como quinto presidente da Torre de Vigia em 30 de Dezembro de 1992 é verdadeiramente significativa para os 13 milhões que agora frequentam os Salões do Reino. À primeira vista, a escolha de um conservador firme para o lugar pode parecer garantir uma continuação do status quo, com poucas mudanças no futuro próximo para as Testemunhas de Jeová. Mas um olhar mais detido revela que esta nomeação é a última posição da velha guarda conservadora -- uma indicação de que são iminentes mudanças radicais na liderança e nas doutrinas da seita.
Aos 72 anos Henschel tornou-se o segundo membro mais novo do Corpo Governante, e foi seleccionado para liderar por homens vários anos mais velhos que ele. (Tanto a média como a mediana das idades na altura da nomeação de Henschel eram cerca de 82 anos.) Com membros nos seus oitenta e tal anos a dormirem durante as reuniões e a votarem nas matérias depois de serem acordados (veja o relato de Raymond Franz no seu livro Crise de Consciência, p. 40), o Corpo está a perder a sua capacidade de providenciar uma liderança com objectivos e decisiva. Henschel foi sem dúvida escolhido em parte devido a ter vitalidade que falta a outros. Obviamente, estes líderes envelhecidos não poderão manter as rédeas do poder durante muito mais tempo. Os homens que participaram na construção da Torre de Vigia até torná-la naquilo que é hoje deixá-la-ão em breve para trás para outros administrarem.
Nas décadas que se seguiram à morte do fundador Charles Taze Russell, o seu sucessor J. F. Rutherford viu-se obrigado a rescrever muitas das doutrinas principais da seita. Pode-se esperar o mesmo quando as Testemunhas de Jeová de uma nova geração herdarem as posições actualmente ocupadas por Milton Henschel e pelos outros membros idosos do Corpo Governante. Quando os novos líderes assumirem o controle, abandonarão a proibição de transfusões de sangue? Só o tempo o dirá. Mas, mesmo que o façam, isso não fará diferença para aqueles que já morreram, nem para aquelas Testemunhas que continuam a morrer enquanto o ensino continua em vigor.

Davi A. Reed

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